24.5.08

um tempo de silêncio



em «três tempos», de Hou Hsiao-Hsien, contam-se três histórias diferentes em outras tantas épocas - sempre um homem e uma mulher, sempre os dois mesmos actores. no primeiro desses tempos, há três belíssimos pormenores: a) depois de jogar snooker com may pela primeira vez, chen despede-se e sai do salão mas, minutos depois, regressa e diz-lhe, com uma simplicidade encantadora, "eu escrevo-te" - e escreveu mesmo; b) quando chen, depois de muito procurar, volta a encontrar may, já noutro salão, diz-lhe "olá"; ela fica feliz e sem saber o que dizer, ambos rindo tontamente, trocando palavras sem nexo e bebendo chá; c) nessa mesma noite já madrugada, à chuva, enquanto esperam o autocarro que levará chen de volta ao quartel, dão-se as mãos pela primeira vez.

o aparente desleixo com que Hsiao-Hsien filma isto (não c, mas a ou b) é mesmo só isso, aparente, porque o detalhe e a preparação dos tempos são milimétricos, e o tempo com que brinda estas personagens é profundamente, digo mais, profundamentissimamente (se não existe, invente-se) humano. haja tempo para o silêncio, tempo para o humanismo de Hou Hsiao-Hsien.